Tem que correr, tem que suar, tem que malhar. Vamos lá!
Alguém aí lembra da música “Estrelar”, do cantor e compositor Marcos Valle? Ela começa assim, como no título acima, e explodiu nos anos 1980 no Brasil, despertando a sociedade para uma consciência corporal e atenção à saúde, acompanhando o movimento de novos hábitos da população, que buscava viver de forma saudável afinal, nessa época ainda era comum e liberado o consumo de cigarros, por exemplo, em qualquer ambiente ou fora deles; e mais circulavam com frequência no meio musical, esportivo, em produções audiovisuais, e em belíssimas propagandas nos jornais, nas revistas, no rádio e na TV, como algo bacana, supernormal, sem nenhuma restrição. Foi somente, com o avanço da pesquisa científica mundial, em torno de seus efeitos maléficos, no corpo humano, em meados dos anos 1990, que o cigarro foi retirado aos poucos da cena pública, sendo considerado hoje uma droga lícita.
Neste contexto, a música “Estrelar” se tornou hino, um verdadeiro hit da malhação que embalou aquela geração; sabe aquela música chiclete que tocava no rádio, na novela? Era isso. O povo botou o bloco na rua, nas academias (que se expandiram), e saiu a se exercitar no melhor estilo, saúde é o que interessa. Mais recentemente, nos últimos anos, as novas gerações reeditam este momento icônico da atividade física, pois não é que hoje, a malhação e as corridas de rua, ganharam a adesão de milhares de pessoas em todo o país. Aliás, não foi à toa que o esporte mais praticado em 2024, foi justamente a corrida de rua. Até o Bell Marques, ícone da Axé Music, já tem uma corrida pra chamar de sua gente! Olha isso. 100% Você! Uma dessas inspirações, que também colaborou para o crescimento do esporte, foi a atitude do jornalista e apresentador do jornal Hora 1 da Rede Globo, Roberto Kovalic, que diante de um problema de saúde dividido com o público, decidiu praticar a corrida, e foi compartilhando sua experiência no noticiário matinal; logo os telespectadores aderiram a ideia que virou sucesso, se transformando num quadro fixo do telejornal: “Correndo com o Hora 1”. O certo é que se criou uma consciência geral sobre os cuidados com a saúde, e todo esse movimento provocou outra corrida, mas esta, às lojas de materiais esportivos em busca do vestuário, acessórios e tênis específicos, para malhar, caminhar, pedalar ou correr.
Assim, se vive um momento fantástico caro leitor, verdade seja dita, é muito bem vinda toda essa preocupação com a saúde do corpo e da mente, numa época em que não apenas o cigarro (ou o cigarro eletrônico), mas diversos outros malefícios da sociedade moderna ameaçam a saúde humana. É mais que necessário, é indispensável a prática da atividade física, por toda a população. Todavia, e lembrando Noel Rosa (1910-1937), “O X do Problema”, nesta crônica é sugerir que, assim como, é fundamental exercitar o corpo, na academia ou em corridas de rua, é urgente compreender na mesma medida, que a saúde do cérebro, também exige exercício. Como? Por meio, da leitura e da escrita.
Atualmente, circula em redes sociais, a falsa ideia de que as facilidades tecnológicas, e as inteligências artificiais da vida, substituirão o ato de ler um livro físico, ou escrever de próprio punho. Para aqueles que querem se enganar, boa sorte. Mas, para aqueles que desejam encontrar o seu lugar no mundo, e apostar no próprio talento, para se tornar um profissional, no mínimo competente, é preciso consolidar a habilidade de ler constantemente, uma vez que, segundo especialistas esta prática favorece o desenvolvimento cognitivo e emocional. Além disso, ter uma cultura leitora desde a infância estimula a criatividade, fortalece a comunicação e desenvolve o senso crítico. Desse modo, diminua o tempo nas telas, exercite a leitura em livros físicos, se cerque de bons títulos, leia e releia os diversos gêneros textuais, faça disso um hábito, reserve uma hora do dia para ler, e depois acrescente aos poucos, duas, três, quatro, crie um ambiente apropriado, elimine interferências, forme sua própria biblioteca. Tenha atitude, para promover seu crescimento intelectual, ampliar seu vocabulário, sua visão de mundo e sua consciência crítica. É assim, que se exercita o cérebro, e se constrói um leitor.
Na outra ponta está a escrita, não aquela do teclado do computador, mas a escrita cursiva na folha de papel. Sim, esta que é uma das maiores conquistas que a humanidade já desenvolveu, e que precisa ser frequentemente valorizada na sociedade, mas especialmente na escola. É inaceitável que hoje, tantos se prestem ao desserviço de sugerir que, estudantes do ensino básico, podem dispensar canetas e cadernos, e apenas clicar aqui e ali, para escrever, copiar ou construir um texto. Tal prática, deturpa o real significado da escrita, pois segundo especialistas escrever à mão desenvolve habilidades cognitivas insubstituíveis; e pesquisas ainda apontam que a prática da caligrafia, combate dificuldades de aprendizado e expressão, bem como, ativa áreas motoras, e produz um exercício cerebral completo.
Então, basta de desinformação! É importante cultivar o hábito da leitura e da escrita entre crianças e adolescentes; teclados e modernices tecnológicas estão descaracterizando a aprendizagem, empobrecendo o repertório estudantil e atrofiando o cérebro dos educandos. Para mudar este cenário, é necessário que a família também mude seu estilo de vida e ofereça espaço a prática dessas habilidades em casa, fazendo circular a leitura de revistas, gibis, livros infantis, infantojuvenis, literatura brasileira, clássicos da literatura mundial, ficção científica e diversos outros gêneros. Para sugerir a escrita disponha de cadernos, palavras cruzadas, diários, blocos de anotações, lápis, canetas, lápis de cor, para motivar crianças, jovens e adultos também, pois crianças aprendem a partir do exemplo. E na escola, essas habilidades devem ser exploradas regularmente, a fim de desenvolver aprendizagens múltiplas nos educandos.
Portanto, caro leitor nada contra malhar, caminhar, pedalar, correr e deixar a saúde do corpo e da mente em dia. Tá tudo certo! Mas, lembre-se, o cérebro também precisa ser exercitado, provocado, desafiado. Elimine dificuldades de aprendizagem, lendo, escrevendo, e à medida que praticar, ler e construir textos se tornarão tarefas prazerosas. Assim, a leitura e a escrita deixarão de ser aquela obrigação chata, e se transformarão numa chave para muitas descobertas e possibilidades.
Angely Costa – Professora – Bibliotecária
Especialista em Literatura, Estudos Culturais e outras Linguagens
Jornal O Dia – 09/05/2025